Gustavo Barcellos
Fraternidade não é unificar diferenças, é diferenciar semelhanças. A experiência da alteridade é inquietante, desafiadora, e começa com o irmão. O campo do Outro é vasto, cheio de prazeres e dores. Tanto do ponto de vista pessoal, quanto do ponto de vista coletivo, as possibilidades do arquétipo fraterno são imensas: solidariedade, companheirismo, amizade, associações, cooperação, entendimento, lealdade, aceitação. Também grandes são suas feridas: rivalidade, inveja, hostilidade, autoritarismo, guerras civis, intolerância, preconceito.
Principalmente no que tange o arquétipo fraterno, nossa tradição mitológica e cultural inicia-se com uma história de disputa, rivalidade e ciúme entre irmãos, que leva ao fraticídio e ao exílio: Caim e Abel. É uma ferida muito profunda. O mito coloca, já de início, as relações de irmandade num lugar de horror, de morte e de impossibilidade. As emoções da inveja e do ciúme, sempre tão corrosivas e patologizadas, estão contidas nessa história de modo paradigmático. É preciso adentrar a fantasia dessas emoções, para se entender mais profundamente as feridas e a sombra das relações simétricas. Apesar de capturarem nossa alma às vezes de modo muito semelhante, e de podermos por isso confundi-las, inveja e ciúme são emoções bastante diferentes.
É com o irmão que aprendemos a dividir e compartilhar, onde aprendemos horizontalidade nas relações. O irmão é a base arquetípica para a construção do Outro, e para a recriação de uma idéia e de um sentido de comunidade dentro das novas ordens do Ocidente contemporâneo.
2009 –