Cadernos Junguianos nº 15 – 2019
Sumário
Editorial
Artigos
Ainda estamos vivos – a psicologia arquetípica diante dos desafios de uma civilização em transição
Marcus Quintaes et al.
Ovelha negra da família: o simbolismo da vivência da sombra familiar e sua transformação rumo à individuação
Fabiana Lopes Binda Grazi / Marina Pastana Maluf
Sonoridades anímicas
Adriane Garcia Salik / Juliano Maluf Amui
Notas para um perspectivismo arquetípico
Maurício Silveira dos Santos
Colômbia, Brasil e América: a jornada do Guesa e a identidade latino-americana
Ana Luisa Teixeira de Menezes / Gil Antonio de Britto Duque / Walter Boechat
Alma LGBTQ+: gênero, sexualidades e a anima na contemporaneidade
Guilherme Scandiucci
Crítica de Jung ao racionalismo: história e reflexões
Maximiliano Zacalusni Silva
A alma brasileira nas emergências políticas
Melissa Fernandes Manhães
A música em nós: considerações sobre música, arquétipo e função sentimento
Priscila Valente Alonso
Histórias e memória
Meu encontro com Jung: memórias e devaneios de uma visita a Seestrasse 228 Henrique de Carvalho Pereira
Resenhas
O conto da aia
Joyce Werres
Orientações aos Autores para Publicação
Ainda estamos vivos – a psicologia arquetípica diante dos desafios de uma civilização em transição
Sinopse: Como a psicologia arquetípica responde aos desafios de uma civilização em transição? A sociedade contemporânea valoriza cada vez mais padronizações, homogeneidades e consumos standard. Nessa forma de viver, entrar em contato com a diferença do outro e com os próprios desejos se torna cada vez mais insuportável. A psicologia arquetípica, por ser uma psicologia plural, quer criar condições para que as singularidades, multiplicidades e subjetividades apareçam. Em tempos de individualismos desenfreados, essa psicologia pretende legitimar as múltiplas formas do viver da própria psique. Neste artigo, traremos reflexões de como a clínica da psicologia arquetípica busca novas maneiras de se relacionar com as imagens que emergem a partir de nossa história e de nossa cultura nos dias atuais.
Palavras-chave: arquetípica, corpo, tecnologia, literatura, diversidade.
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Ovelha negra da família: o simbolismo da vivência da sombra familiar e sua transformação rumo à individuação
Sinopse: O presente artigo visa a discorrer sobre as implicações psicológicas da vivência do papel familiar de ovelha negra à luz da psicologia analítica de C. G. Jung e do filme Pieces of April (2003), cujo título foi traduzido para o português como Do jeito que ela é. Buscou-se entender a dinâmica familiar que envolve o complexo de ovelha negra – qual a sua função nesse âmbito – e refletir sobre os aspectos psíquicos que levam um indivíduo a ser escolhido e aceitar viver o lugar do estranho, diferente, inadequado e culpado. A partir desse ponto, analisaremos como a pessoa que está possuída por esse papel pode tornar-se consciente do mesmo e, criativamente, transformar isso a seu favor.
Palavras-chave: ovelha negra, sombra, projeção, psicologia analítica, Jung.
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Sonoridades anímicas
Sinopse: As sonoridades presentes nos mitos indígenas são estudadas neste artigo como metáforas da compreensão da alma, do cosmos, da natureza e do homem. O objetivo deste trabalho é compreender a relação entre som e psique, por meio de levantamento bibliográfico de mitos dos índios brasileiros Guarani, Kamayurá, Ywalapiti e Wauja. Os resultados alcançados revelam relações entre o som e a psique, entre elas: o som como parte da origem psíquica do homem, som musical como linguagem, alma como som habitado, som e cura da alma, sonhos sonoros, ligação entre som e movimento emocional e, por fim, relações entre o som e o si-mesmo. Conclui-se com este trabalho que o som pode ser considerado como uma imagem anímica, evocando os tons afetivos da alma.
Palavras-chaves: som, alma, mitos indígenas, imagem arquetípica, psicologia analítica.
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Notas para um perspectivismo arquetípico
Sinopse: Este trabalho aborda a forte influência teórica e biográfica do filósofo alemão Friedrich Nietzsche na obra psicológica de Carl Gustav Jung, especialmente no que diz respeito ao conceito nietzschiano de perspectivismo. Procuraremos demonstrar como a intuição e a proposta perspectivistas constituem a base do pensamento de Jung, presentes em tópicos decisivos de sua obra: nas teorias dos tipos psicológicos, dos complexos e dos arquétipos, assim como na própria concepção do que é uma teoria psicológica. A possibilidade de pensar a partir do perspectivismo permitiu a Jung compreender que as contradições entre as psicologias freudiana e adleriana não eram devidas a equívocos, mas que correspondiam às diferentes concepções vitais de seus criadores, assim como a sua própria teoria. Demonstraremos que o perspectivismo também está presente de forma muito decisiva em uma das derivações mais criativas e consistentes da obra de Jung, a chamada psicologia arquetípica de James Hillman.
Palavras-chave: perspectivismo, Nietzsche, teorias psicológicas, politeísmo, psique plural.
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Colômbia, Brasil e América: a jornada do Guesa e a identidade latino-americana
Resumo: Quem, nascido índio, partiria da Colômbia e, fugindo de um sacrifício involuntário de sangue, embrenhar-se-ia na Amazônia e percorreria o mundo até o sacrifício consciente e libertador da alma latino-americana? A resposta é: O Guesa. Um poema épico escrito em 1858 pelo poeta maranhense Sousândrade, onde a figura do Guesa é descrita como “a de um anti-herói brasileiro e hispano-americano que, como eterno exilado, viaja pelo mundo, num incessante périplo, em busca de sua identidade”. Reconhecendo o Guesa como expressão mítica e heroica da nossa busca por uma identidade única, mas ao mesmo tempo híbrida e transcultural, este trabalho pretende apresentar e percorrer os caminhos do Guesa, de Sousândrade, no sentido de lançar um olhar e dialogar sobre as dimensões simbólicas, culturais e psíquicas que nos constituem enquanto sul-americanos. Nas palavras de Luiza Lobo, a jornada do Guesa “é o símbolo da resistência da cultura latino-americana” e “a inserção desse personagem representa a afirmação de um novo tipo de identidade híbrida para a América do Sul, multifária e tropical”.
Palavras-chave: literatura brasileira, identidade latino-americana, complexos culturais, psicologia junguiana, Sousândrade.
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Alma LGBTQ+: gênero, sexualidades e a anima na contemporaneidade
Sinopse: O artigo pretende fazer uma revisão crítica das ideias e reflexões de Carl G. Jung a respeito da sexualidade e das questões de gênero. E também pensar a possível aproximação da teoria desse autor com fenômenos da contemporaneidade, mais especificamente as identidades de gênero e a transexualidade/transgeneridade. Trata-se de uma pesquisa qualitativa que adotou como metodologia o levantamento bibliográfico em torno dos temas eleitos, sempre circunscrito ao corpo teórico da psicologia analítica. Ainda que certos preceitos e observações de Jung apresentem uma espécie de universalismo característico de sua época, e tenham um caráter típico dos valores que lhe eram contemporâneos, determinados aspectos de sua teoria podem ser bastante úteis para a compreensão de fenômenos tipicamente pós-modernos, atuais. As ideias de alma, animus e anima mostraram-se ferramentas úteis para pensar, tanto intelectualmente quanto clinicamente, os fenômenos que envolvem as pessoas que apresentam formas diversas de vivência da sexualidade e da identidade de gênero, pois é uma teoria que não leva ao caminho da patologização dessas pessoas ou da heterossexualidade como norma.
Palavras-chave: gênero, pós-modernidade, transgeneridade, queer, anima.
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Crítica de Jung ao racionalismo: história e reflexões
Sinopse: Este artigo propõe abordar o percurso do pensamento junguiano na composição de uma crítica geral ao racionalismo. Levantou-se material bibliográfico, analisado com o emprego de uma metodologia analítico-descritiva. Procurou-se, em primeiro lugar, evidenciar a construção histórica do racionalismo, com início na Idade Média, e seus desdobramentos no Renascimento, Iluminismo e Era Moderna, até alcançar a hegemonia racionalista contemporânea. Utilizando como referencial o enfoque teórico junguiano, notadamente o conceito de enantiodromia, foram enfatizados os movimentos racionalistas que impactaram a cultura e a ciência, e cuja influência se faz sentir nas atividades psíquicas conscientes e inconscientes dos indivíduos em cada período histórico. Chega-se, assim, à descrição do zeitgeist contemporâneo à obra de C. G. Jung, procedendo-se então à análise de suas reflexões sobre a proeminência unilateral da razão. Dessa forma, podem-se apreender implicações que tiveram forte impacto na construção de sua obra e não só indicam uma hipótese de compreensão do aspecto ontológico irracional ou transcendente, mas também evidenciam a profundidade dessas manifestações da cultura.
Palavras-chave: racionalismo, crítica, modernismo, história, psicologia analítica.
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A alma brasileira nas emergências políticas
Sinopse: Este trabalho se propõe a esboçar os contornos da alma brasileira, extraindo traços da sua identidade na tormenta política dos últimos anos. Para tanto, é apresentado um escorço da constituição étnica do brasileiro, passando-se, em seguida, à análise de alguns dos seus principais complexos culturais, alimentados pelos traumas coletivos iniciados com a invasão da Terra Brasilis pelos europeus. Nesse contexto, dialoga-se também com o arquétipo do puer, em especial, associado ao sentimento de inferioridade e à corrupção, que enfrenta sua contraposição, o senex, em lideranças políticas conservadoras. Diante desse quadro, religião, futebol e política, temas sobre os quais, em princípio, não se deveria discutir, são trazidos a lume como manifestações de brasilidade. Com enfoque na política, alguns dos principais eventos dos anos 2013 a 2019 são relembrados, traçando-se um paralelo com traços sociopolíticos da escravidão. A dramatização dessa herança escravagista pode ser vista, pois, como uma tentativa de integração da sombra cultural.
Palavras-chave: brasilidade, cultura, complexo, política, sombra.
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A música em nós: considerações sobre música, arquétipo e função sentimento
Sinopse: A partir da compreensão de que a música pode ser uma experiência arquetípica, a autora reflete sobre sua influência em nosso cotidiano. Para tanto, toma a ideia de arquétipo de Jung e o método da psicologia arquetípica de Hillman como base desse entendimento. O artigo focaliza especialmente a função sentimento nas reflexões apresentadas, por acreditarmos ser ela a mais solicitada quando estamos em contato com a música.
Palavras-chave: música, arquétipo, função sentimento, mito, Jung.